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O lado oculto das lesões

Muitas vezes as lesões surgem de uma forma inesperada e não sabemos bem qual foi o motivo que as originou. A fisioterapeuta e osteopata Eva Arrieta explica-nos as principais causas das lesões, aprofundando o tema de uma forma que supera o lado mais óbvio, como o excesso de treino, posturas incorretas ou quedas.

EVA ARRIETA // FOTOS: XAVIER BRIEL Y CAPE EPIC

O lado oculto das lesões
O lado oculto das lesões

Quando nos lesionamos temos tendência a encontrar motivos tais como um movimento incorreto, uma queda, azar, exaustão ou excesso de treino quando nos preparamos para uma prova. Mas já alguma vez pensaste que te lesionas mais quando atravessas uma má fase emocional, excesso de stress ou estás num dia muito mau? Se refletires um pouco sobre as tuas lesões, provavelmente descobrirás que nos dias em que a tua mente ou emoções não estão equilibradas e vais treinar quase por obrigação, ou sais a pedalar como um louco para libertar a tensão, são aqueles em que esse ponto fraco dói mais e isso acaba por te levar ao fisioterapeuta ou às urgências, afastando-te da bicicleta durante algum tempo.

Os fisioterapeutas são os nossos companheiros de fadiga, não só libertam os nossos músculos quando estamos bem, mas também nos acompanham na recuperação de lesões, e ouvem-nos. Muitas vezes compreendem-nos melhor do que nós próprios. A fisioterapeuta espanhola Eva Arrieta é a autora do livro "Por que ficamos doentes? Ouve o teu corpo, conhece-o e melhora a tua saúde", no qual descobre a grande ligação entre a parte física e emocional quando se trata de compreender porque é que nós, atletas, nos lesionamos. É uma leitura que recomendamos vivamente a desportistas. Nas páginas deste livro podes encontrar orientações para cuidar de ti próprio, melhorar a tua dieta, gerir melhor as tuas emoções, compreender como funciona o teu corpo e por que ficas doente ou lesionado enquanto praticas desporto e, com tudo isto, aprender a viver mais e melhor. 

COMPREENDER AS LESÕES COMO UM TODO 

Em geral, os desportistas sabem como é importante cuidar da sua dieta e bem-estar físico com o objetivo de alcançar um desempenho desportivo elevado. Neste artigo irás descobrir outros aspetos que provavelmente desconheces e que demonstram, de uma forma importante, o facto de as lesões incomodarem ou limitarem a tua prática desportiva e, por conseguinte, a sua eficácia. A origem fisiológica das lesões e doenças pode dever-se ao surgimento de um meio interno ácido no teu organismo.

O fluido que envolve cada uma das tuas células, através do qual respiram, é nutrido e purificado, e precisa de ter as condições ideais para que as tuas células musculares e articulares funcionem no seu melhor. Este fluido, chamado fluido intersticial, é canalizado para uma estrutura do corpo composto pelo sistema fascial. Este sistema fascial envolve os teus músculos, tendões, articulações, ossos, órgãos, artérias, veias e nervos. Desta forma, formam-se “autoestradas” de informação que ligam todo o nosso corpo e é através destas autoestradas que circulam os impulsos elétricos que produzem os movimentos, bem como a ordem fisiológica que o organismo requer para uma certa função. Para que a informação flua de forma coerente, este meio aquoso interno precisa de ser ligeiramente alcalino, tal como o sangue.

Quanto mais intoxicado e ácido for este meio interno, mais difícil será para o nosso corpo funcionar corretamente e mais facilmente pode ser lesionado. 80% da intoxicação que vem do exterior entra pelo trato digestivo. Açúcares, alimentos processados, produtos lácteos, carne vermelha e excesso de hidratos de carbono são o que mais nos acidifica. Tal como as pilhas alcalinas, o nosso corpo obtém mais energia de uma dieta que tende a alcalinizar o corpo. O excesso de hidratos de carbono como medida normal, mesmo para nos reabastecermos após a atividade física, dá-nos uma sensação de recuperação rápida, mas a longo prazo o corpo vai exigir mais hidratos de carbono devido à queda da insulina que ocorre. Esta é uma das origens da alteração metabólica que se sofre na nossa sociedade, incluindo as crianças e os desportistas.

7 FATORES QUE PODEM CAUSAR LESÕES... E SOBRE OS QUAIS PROVAVELMENTE NUNCA PENSASTE

Estou ciente de que vocês, leitores da BIKE, estão perfeitamente conscientes das indicações e informações que tantos nutricionistas, médicos e profissionais qualificados deram aqui sobre uma dieta correta. A minha tarefa, a mesma que me encorajou a escrever o livro "Porque é que ficamos doentes", será colocar sobre a mesa outras fontes de intoxicação e, portanto, de possíveis lesões.

1> A BOCA

A boca é a "grande esquecida" dos desportistas e uma fonte desconhecida de alterações físicas no corpo. Isto é normal, uma vez que é a única parte do corpo que não requer treino. Curiosamente, a boca é o esconderijo ideal para as bactérias, que podem permanecer latentes durante muito tempo, mesmo sobrevivendo aos antibióticos. Quando as nossas defesas caem, por exemplo, quando estamos esgotados ou estamos a poucos dias de um evento importante, estas bactérias entram na corrente sanguínea e podem conquistar qualquer tecido causador de dor e inflamação. Ouvi falar de uma equipa de futebol que decidiu não assinar um contrato com um jogador porque associavam as suas lesões frequentes à sua saúde dentária. Além disso, enchimentos, massas e aparelhos orais geram uma interferência elétrica na boca que altera a transmissão elétrica através das nossas “autoestradas” de informação e pode afetar qualquer estrutura, independentemente da sua distância. Na minha profissão tratei tendinites, problemas de pele e artrite que não desapareceram até que os atletas removeram os seus aparelhos dentários.

2> O SISTEMA DIGESTIVO 

Imagino que já tenhas lido mais do que uma vez acerca da importância de manter a mucosa digestiva e a microbiota intestinal em bom estado. A assimilação de nutrientes está em jogo e também o possível aumento da quantidade de substâncias ácidas que penetram no interior da "nossa casa". Além disso, as bactérias, vírus, fungos e parasitas podem conquistar o nosso trato digestivo sem que tenhamos consciência disso. Estes microrganismos geram toxinas que podem ir parar aos nossos músculos e articulações. Efusão sinovial, tendinite de Aquiles, fascite plantar, epicondilite, pé de atleta ou dores lombares recorrentes são os sintomas que podem ser gerados pelo aumento da toxicidade no teu corpo, quando, como regra, procuramos as causas a nível mecânico. Mesmo a ansiedade, palpitações ou mau humor podem ser desencadeados por um intestino que funciona mal. O corpo fala-nos através das lesões para nos avisar de que temos de prestar atenção a alguma desarmonia.

3> OS PRECONCEITOS E BARREIRAS 

Não imaginas que o que os teus pais repetiram vezes sem conta na tua infância poderia estar a condicionar a tua vida? Os pais tentam transmitir o melhor, mas também transmitem os seus medos, os seus preconceitos e as suas crenças. O cérebro das crianças, especialmente dos dois aos seis anos de idade, absorve a informação que recebe e regista-a como uma crença que o pode limitar. "A vida é dura"; "tudo requer muito esforço"; "nunca conseguirás nada na vida"; "tu és fraco", etc. Estes exemplos podem ser as razões pelas quais, por muito que treines e te esforces, nunca obténs os melhores resultados ou ficas lesionado antes de uma prova. O teu inconsciente pode acreditar que nada é alcançado sem grande esforço na tua vida, ou que o teu corpo é frágil, e estas crenças, adquiridas na tua infância, boicotarão as tuas conquistas. Alterar a informação que não é positiva e reprogramar o teu inconsciente é, para além de ser possível, altamente recomendado.

4> O QUE VIVESTE NO ÚTERO DA TUA MÃE 

Embora possas achar surpreendente, todas as emoções que a tua mãe sentiu durante a sua gravidez chegaram a ti quando estavas dentro do útero. As emoções foram transformadas em substâncias químicas que circularam no sangue da tua mãe, que era o teu alimento, durante nove meses. Todo o stress, medos, preocupações, ou mesmo a frustração de engravidar quando não se quer, pode deixar uma marca emocional. Também pode ser que a tua mãe tenha sofrido de uma perturbação como uma doença, ou a perda de um ente querido, e este facto diminuiu a antecipação da tua vinda. Como podes ver, nem sempre saímos da linha de partida quando iniciamos a corrida da vida, por vezes as circunstâncias familiares colocam-nos alguns metros para trás, numa clara desvantagem. Talvez esta não seja uma informação fácil de obter porque é mantida em segredo nas famílias, mas pode ser determinante para esclarecer algumas tendências prejudiciais. Os teus músculos e articulações não são apenas um reflexo do que comes e treinas.

5> A TUA PÉLVIS E A TUA FAMÍLIA 

Todos os desportistas, e até os jornalistas desportivos que “fazem diagnósticos” a partir dos microfones, sabem a importância de certos músculos como o psoas-ilíaco, o piramidal ou os isquiotibiais para o fluxo da mecânica desportiva. Podes perguntar-te novamente o que é que a família tem a ver com o título deste ponto. Não é que eu tenha algo contra a vida familiar, mas o facto é que herdamos da família memórias e "fardos" que frequentemente bloqueiam a pélvis, o abdómen e alteram todo o equilíbrio requintado deste corpo e centro energético. Esta área, fundamental para um desempenho desportivo ideal, está sujeita a conflitos emocionais não cicatrizados por parte dos nossos pais. Estudos psicossomáticos e transgeracionais lançam luz sobre isto, e ajudam-nos a compreender as relações entre as diferentes partes do corpo e as inconsistências emocionais que podem levar a lesões nestas estruturas. No livro aprofundo este tema da herança familiar para que tu te possas tornar um investigador do que o teu DNA transporta para além das semelhanças físicas com os teus antepassados. Esta informação ajudar-te-á a compreender porque é que estás sempre lesionado na mesma área, porque é tão difícil recuperar de uma lesão, ou porque é que pensas que algo crónico se instalou no teu corpo. Fascinante, não é?

6> O QUE ESCONDE O TEU FÍGADO 

Não estou a falar das cervejas no final do treino, mas da frustração, da fúria e do mau humor que te afetam porque não consegues treinar ou porque não atinges os objetivos que estabeleceste. Já deves ter ouvido dizer "isto está a pôr-me doente". De facto, o fígado acumula toda a raiva, inveja, impotência e deficiências de todo o tipo que se podem acumular no dia a dia. Uma tendinite no ombro direito, ou uma lesão no menisco pode ter a sua origem num fígado sobrecarregado. Sabemos que o fígado é um órgão fundamental para a desintoxicação do corpo, juntamente com o intestino, os rins, os pulmões e a pele. Podes cuidar bem dos seus músculos, da sua flexibilidade e da sua potência, mas se não cuidares dos órgãos acima mencionados, o corpo irá progressivamente acidificar-se e a lesão de um músculo, tendão, ligamento ou fáscia irá aparecer com um movimento brusco ou por esforço repetido. A nossa cabeça irá atribuí-lo ao tipo de treino ou ao facto de termos dormido mal, mas a verdadeira origem da lesão já estava no teu corpo e o movimento que a causou foi simplesmente a gota de água que fez transbordar o copo.

7> O MEDO DO FRACASSO

O medo é o grande constrangimento para uma pessoa; poderíamos dizer que é o inimigo a ser vencido. Em circunstâncias em que se tem de atingir os limites, quando enfrentas um desafio exigente na competição desportiva, os teus medos podem surgir no teu inconsciente e negar o teu potencial. Pode até ser que estejas em muito boa forma, que tenhas alcançado os teus objetivos no treino, mas quando te vês confrontado com o momento da verdade, sentes-te impotente ou uma lesão "inoportuna” aparece para te lembrar de que não és digno de sucesso. Todas as lesões e conflitos emocionais que se acumulam no porta-bagagens do teu veículo corporal podem manifestar-se em algum momento da tua vida como uma espécie de medo. Como exemplo, para as pessoas que sempre tiveram padrões elevados, o medo de falhar e de não estar à altura pode pregar-lhe partidas sob a forma de lesões quando os seus próprios padrões são ultrapassados. Como deves ter notado, o teu corpo é um reflexo, não só do teu treino, mas também daquilo por que estás a passar. 

Enquanto não estiveres consciente das cargas emocionais que carregas e herdaste, não estarás no controlo da tua estabilidade física, emocional e mental. Se não compreendes porque é que um dia o teu monitor do ritmo cardíaco parece ter disparado, ou os teus músculos estão sem combustível, pergunta-te o que se está a passar na tua vida. O teu corpo é teu aliado, não teu inimigo. Ouve-o e não exijas o desempenho que normalmente te dá se não estiveres num dia bom. Querer cumprir um treino sem estar nas melhores condições, quando sentes que o teu corpo não está a fluir, pode eventualmente causar-te lesões graves que poderão estar relacionadas com essas autoexigências. Não somos exclusivamente um corpo físico. O teu mundo interior precisa de treino, de alongamentos e alimentação adequada. Analisa-te, liberta o stress emocional, adapta o teu corpo ao dia que está a viver e abandona a rigidez mental para que o desporto seja sempre a cura e não o problema. 

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