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Como manter a forma

Se conseguiste treinar durante o Inverno, fazendo séries curtas e jornadas longas, é provável que estejas em forma. Até é bem possível que nestas primeiras provas os dados do teu potenciómetro sejam realmente os melhores que tiveste. E agora? Até quando vais conseguir render assim? O que é que tens de fazer para não perder a forma? Deves treinar mais ou menos? Continua a ler...

Jorge Blasco

Como manter a forma
Como manter a forma

O tempo necessário para ficar em forma numa temporada varia de modo individualizado. Cada um é como é e tem as suas características e o seu contexto. O nível de andamento, os anos de experiência, a disponibilidade e o tipo de treino vão influenciar no tempo necessário para poder chegar a esse nível máximo. Como regra geral, podemos dizer que são precisos pelo menos 3 meses e no máximo 6 para conseguir atingir um pico de forma. 

Mas neste artigo não vamos falar disso. Vamos explicar como conseguir manter esse pico de forma durante algum tempo. Estar no topo da nossa forma significa que conseguimos levar ao limite as adaptações fisiológicas a nível cardiovascular, metabólico, neuromuscular e até psicológico, que favorecem esse desempenho. 

No caso específico do BTT, traduz-se em valores máximos, acima das referências de outros anos, de consumo de oxigénio, de potência nos diferentes limiares, de eficiência energética e de força no ginásio se trabalhámos esta característica de forma correta. Quando chegarmos a esse nível, primeiro devemos confirmar se esse é realmente o nosso valor máximo. A capacidade de adaptação do corpo esgota-se, mas também se regenera. Ou seja, em cada temporada teremos um máximo que conseguiremos alcançar, ao qual chegaremos depois de termos esgotado a capacidade de adaptação do corpo. No entanto, convém salientar que somente depois de darmos o devido descanso ao nosso corpo (por exemplo, no final da temporada), e de perdermos esse nível máximo de forma, é que o corpo voltará a ter capacidade de adaptação. Dependendo da idade, da experiência e da carga de treino prévia é possível que nesta temporada o pico de forma seja superior ao da temporada anterior. E para podermos alcançar este pico devemos treinar tanto ou mais do que na temporada anterior. A grande diferença é que as adaptações residuais, as que não desaparecem num mês ou dois de descanso, vão permitir-nos aguentar uma maior exigência de treino desde o início e essas adaptações vão melhorando, com o decorrer do treino.

O treino de base, ou seja, tudo o que fizeste nesta temporada e nas temporadas anteriores, é preponderante. Esse treino acumulado ano após ano é o que nos vai permitir a dar o salto em termos de forma física. O pior é que nunca sabemos qual é exatamente esse potencial máximo. Além disso, não sabemos que carga máxima de treino seremos capazes de assimilar. 

PROGREDIR AO LONGO DOS ANOS

Só conseguiremos saber se evoluímos se treinarmos ano após ano e temporada após temporada, planificando a médio e curto prazo, medindo e controlando o que fazemos e os seus efeitos e comparando umas temporadas com as outras e os resultados que obtivemos. Apesar de procurarmos sempre uma base científica para os nossos treinos e tentarmos entender os seus efeitos com base no conhecimento atual do funcionamento do corpo e da mente humana, continuam a existir alguns detalhes que ainda não compreendemos e somente a tática da "tentativa e erro" nos pode ir mostrando o que está certo e errado em cada ciclista.

Em qualquer caso, chega um ponto da temporada, depois de treinarmos muito duro, que vemos claramente os efeitos positivos desse treino e nos sentimos competitivos. Quando chegamos a esse ponto temos de planificar o treino para melhorar esse nível, se for possível, ou pelo menos manter o maior tempo possível. Não existe uma resposta clara que diga quanto ao tempo conseguimos manter uma determinada forma. Com base na experiência, podemos dizer que se pode manter um nível alto de desempenho durante longos períodos, desde 1 a 6 meses, às vezes até mais.

Mas não será um desempenho uniforme, haverá pequenos picos e alturas em que não conseguiremos render mais e onde veremos os nossos watts cair. Mas se nos organizarmos bem, sobretudo em termos de descanso e recuperação, o nível mais baixo será suficientemente alto para podermos dizer que estamos em forma. Haverá momentos pontuais onde alcançaremos o nosso máximo e devemos tentar que coincidam com os eventos mais importantes, mas nem sempre o conseguiremos fazer, apesar de estarmos na mesma numa forma invejável durante todo esse tempo. Estes são os nossos conselhos para que consigas atingir esse objetivo. 

BAIXAR O VOLUME DE TREINO 

Este conselho é válido para aqueles que treinam em média mais de 12 horas por semana. Se treinas menos, não faz sentido e será melhor manter o volume ou reduzir. Nesta altura da temporada com um volume médio de 12 horas ou mais já deves ter uma base aeróbica bastante desenvolvida. Introduzir horas no treino não vai fazer com que obtenhas novas adaptações cardiovasculares, mas sim contribuir para aumentar a fadiga e piorar a recuperação das sessões de intensidade (séries). A partir desta altura o prioritário é evitar a fadiga e a monotonia e não melhorar a resistência. Isto não significa que não deves fazer algum treino de longa duração, mas se o fizeres que seja ocasional. 

MANTER OS TREINOS DE INTENSIDADE 

Ao contrário do volume, as adaptações geradas pelos treinos de intensidade perdem-se rapidamente. É por isso que para manter o nível alcançado devemos continuar a fazer estes treinos de intensidade. Dependendo se procuramos manter o nível ou, pelo contrário, ainda pensamos que é possível melhorar o estado de forma, devemos fazer séries. Basicamente, convém reduzir o impacto alargando o tempo de descanso e baixando o volume total das séries em intensidades acima do limiar. Porque quando falamos de intensidade referimo-nos a toda aquela que está acima do limiar funcional (ou limiar anaeróbico). Exceto em semanas de descanso, devemos manter pelo menos uma sessão por semana. Se numa determinada semana não competimos nem saímos para treinar com o nosso grupo (treino duro), será aconselhável fazer duas sessões. 

DAR VARIEDADE AOS TREINOS DE INTENSIDADE  

Dentro do que consideramos intensidade (acima do limiar) podemos fazer variações nas séries que nos proporcionem mais motivação e nos ajudem a editar a fadiga psicológica. Para as séries de intensidade  VO2max devemos ter em conta um máximo acumulado de 20´. Além disso, as séries normais, bem como o período de recuperação devem rondar entre 30" e 4´. No caso das séries dentro do limiar anaeróbico o máximo acumulado deve rondar 45´, portanto as séries ou repetições devem durar entre 6´e 20´e a recuperação parcial deve ter uma relação exercício/descanso de 1/0,5 a 1/0,75. A partir destas premissas podemos desenhar múltiplas variantes de séries. 

MANTER OU AUMENTAR TEMPORARIAMENTE AS SESSÕES DE FORÇA 

Isto dependerá do que fizeste até agora relativamente ao treino de força. Se não fizeste nada no ginásio, agora não é a melhor altura para começar. É melhor esperar que chegue a época de descanso ou a temporada seguinte. Se fizeste treino de força na pré-temporada e a seguir deixaste de fazer, convém agora introduzir um bloco de força nas semanas em que não tenhas corridas ou eventos importantes. Estas sessões devem ser específicas. Se não deixaste de treinar força, mas reduziste as sessões e o volume, pode ser uma boa altura para fazer duas sessões semanais ocasionalmente, quando não tiveres provas e assim mudas um pouco o estímulo. Se treinaste com cargas elevadas deves passar para cargas médias e baixas e fazer alguma pliometria de baixo impacto. Caso tenhas treinado nas últimas semanas com cargas médias e baixas deves introduzir 3 a 4 sessões com cargas altas (nunca acima de 80% de 1RM). No fundo, o objetivo é procurar um estímulo diferente para continuar a forçar a adaptação neuromuscular. 

POLARIZAR A CARGA DE TREINO

Polarizar a carga de treino significa oscilar entre sessões de intensidade aeróbica abaixo do limiar aeróbico (Z1 e Z2), e sessões de alta intensidade que, como referimos, são feitas a intensidades acima do limiar funcional ou anaeróbico (Z6, Z5 e Z4). Deve-se evitar a intensidade média (Z3 e Sweet Spot). Esta forma de distribuição da intensidade de treino é muito eficaz e pode ser usada durante todo o ano, mas nesta parte da temporada, quando já é preciso ter muito cuidado com a fadiga acumulada, é especialmente útil. As semanas de descarga são aquelas em que devemos apostar nesta polarização e assim mudar das sessões de intensidade por sessões de Z3. 

PROCURAR OBJETIVOS E MOTIVAÇÕES CONCRETAS 

A partir de metade da temporada o mais importante é manter a motivação. Nestes meses é mais uma questão de luta psicológica do que física. O corpo aguenta perfeitamente desde que respeitemos o descanso mínimo e as semanas de recuperação, mas a mente é mais volátil. Para ajudar nesta gestão psicológica, é vital ter objetivos concretos que nos motivem. Se competimos em provas regionais não há problema, apesar de que nesses casos pode ser interessante procurar alguma competição fora da nossa "zona de conforto" para quebrar um pouco a rotina, ver zonas diferentes, outros atletas e organizadores. Se participas em maratonas e reparares que durante 2 ou 3 meses não tens nenhuma prova, podes participar numa prova de cross country ou algum Granfondo. Outra opção é organizar uma volta com os amigos (mas a um ritmo duro). 

AUMENTAR AS SAÍDAS EM GRUPO

Para manter a motivação alta, uma estratégia é sair com um grupo que tenha um andamento equivalente. Isto não significa que vais deixar as séries pois, como referimos, são muito importantes para manter o nível, mas é perfeitamente compatível um maior número de saídas em grupo e deixar uma sessão de intensidade por semana. De facto, essas saídas em grupo, se forem com pessoas com um nível igual ou superior ao teu podem ser motivadoras e inclusivé ajudar-te a treinar com mais afinco. 

OUVIR O CORPO E A MENTE E DAR-LHES DESCANSO QUANDO NECESSÁRIO

O descanso é fundamental no treino, mas à medida que a temporada avança torna-se ainda mais importante. Não significa ficar 5 dias na praia porque nos doem as pernas, mas sim manter o equilíbrio entre estímulo e recuperação. O melhor indicador será a nossa perceção de esforço. Se notamos que estamos a perder a motivação, ou sentirmos uma quebra no desempenho, incapacidade para chegar às nossas pulsações máximas em esforços intensos, que a pulsação em repouso sobe, que dormimos mal ou perdemos o apetite, isso são sintomas de fadiga que devemos ter em conta. Perante estes sintomas devemos descansar um ou dois dias (sem tocar na bicicleta) e depois voltar a treinar pouco a pouco, com dois ou três dias ligeiros, até notar que estamos a superar esses sintomas. 

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