O dinamarquês Mads Pedersen foi ontem proclamado campeão do mundo de ciclismo numa das edições mais duras de que temos memória nos últimos anos, sob condições meteorológicas muito adversas, que obrigaram a UCI a modificar o itinerário da prova para poder garantir a segurança dos ciclistas. Mesmo assim, a dureza da prova esteve sempre patente, não só pelo frio que se fez sentir, mas também pelo vento.
O ciclista da Trek-Segafredo, com apenas 23 anos, bateu na linha de meta a concorrência, mais precisamente o ciclista mais cotado dos três que disputavam a vitória, Matteo Trentin. Por sua vez, o suíço Stefan Küng tentou distanciar-se nos últimos quilómetros, mas no final estava claramente em défice, acabando mesmo assim num honroso terceiro posto. Pedersen começou as suas movimentações a cerca de 65 km para a meta, colocando-se em todos os cortes mais benéficos. A cerca de 30 km passou a ter a companhia de Trentin e de Mathieu Van der Poel.
No entanto, Van der Poel "explodiu" a cerca de 10 km da meta, completamente vazio, deixando a vitória entregue - pensava-se na altura - a uma seleção italiana que contava com dois ciclistas: Trentin e Moscon. Contudo, no momento do sprint final, Mads Pedersen mostrou que era o único que ainda tinha reservas de energia, superando tudo e todos.
Além de Van der Poel, mais ciclistas de topo sofreram as agruras desta corrida, como os belgas Gilbert e Evenepoel, que abandonaram após a queda de Phillipe, bem como Alejandro Valverde, que desistiu a 85 km do final. Alaphilippe, Van Avermaet, entre outros, tambiém acabaram por desistir, alguns deles com claros sinais de hipotermia.
Depois de terem trabalhado na fase inicial em prol do coletivo, José Gonçalves, Nelson Oliveira e Rui Oliveira abandonaram a corrida. A cerca de 80 quilómetros do fim, a Equipa Portugal contava apenas com Rúben Guerreiro e com Rui Costa em prova. A 40 quilómetros da chegada foi a vez de Rúben Guerreiro não resistir, sendo um dos 149 desistentes.
“Tive pena de, mais uma vez, não terminar o Mundial, mas era impossível. Trabalhei bastante para ajudar a colocar o Rui, ainda antes do circuito. Apesar de as sensações serem boas, a dada altura senti-me completamente vazio e não consegui seguir no grupo”, explica Rúben Guerreiro.
Rui Costa, sempre bem atento e colocado, soube manter-se no grupo principal. Este é o quarto top 10 do poveiro em provas de fundo do Mundial: venceu em 2013, foi nono em 2015, décimo em 2018 e em 2019. “Foi preciso estar muito forte psicologicamente para encarar um Mundial como este, porque foi um dia de muita chuva e frio. Durante uma prova tão longa como esta, muitas coisas nos passam pela cabeça. As sensações foram boas no início, mas a meio não estava tão bem. Foi preciso ultrapassar esses momentos mais difíceis, esse sofrimento, para chegar melhor aos últimos quilómetros. A corrida fez-se muito dura com o frio e com a chuva”, afirma Rui Costa.
O corredor português preferia que o percurso não tivesse sido alterado. “O traçado previsto iria ser muito mais duro, talvez deixando mais cedo para trás alguns corredores que chegaram aqui na frente. Em todo o caso, um Mundial é sempre duro e hoje viu-se o quão difícil é estar com os melhores. Fico contente com mais este top 10. Sempre que venho à Seleção tento estar nas melhores condições para representar o país, penso que voltei a dignificar as cores de Portugal”, conclui o campeão mundial de 2013.
O selecionador nacional, José Poeira, ficou com a sensação do dever cumprido na prova de fundo para elite. “Nos últimos anos partimos sempre com a ambição de ficar nos dez primeiros e hoje, mais uma vez, conseguimo-lo. A corrida tornou-se muito dura, devido às condições climatéricas. Muitos corredores que vinham para ganhar acabaram por desistir. Nós resistimos. Foi pena aquela fuga, que nos tirou alguns lugares. Apesar de os colegas terem ajudado o Rui Costa em determinada fase da corrida, ele ficou sozinho durante muito tempo. Nessa circunstância não podia ter feito mais do que fez. Esteve muito bem”, salienta José Poeira.