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Indústria das bicicletas atravessa turbilhão

O setor das bicicletas atravessa uma fase extremamente complicada. Enquanto alguns esperavam que o mercado estabilizasse após um boom de vendas logo a seguir ao Covid, a verdade é que ainda não se vê uma luz ao fundo do túnel e algumas marcas tiveram mesmo de fechar portas ou iniciar reestruturações financeiras. Será que atravessamos uma "nova normalidade", ou vivemos uma época atípica em que inúmeras variáveis estão a afetar o negócio?

Carlos Pinto

3 minutos

Indústria das bicicletas atravessa turbilhão

Sejamos sinceros... Ninguém quer falar da crise que a indústria das bicicletas atravessa. Ou melhor, quase ninguém quer falar. Durante os últimos 12 meses, recebemos notícias de despedimentos em grande escala, reestruturações e falências de empresas ligadas a este setor.

A jusante também se verificaram encerramentos de lojas, despedimentos de comerciais, fecho de revistas e de blogues, tudo porque a bolha das bicicletas alimenta indiretamente um conjunto de negócios. 

Mas olhemos para as previsões e para o mercado. Se olharmos para as previsões a médio prazo, praticamente todos os estudos indicam que o mercado vai crescer, sobretudo alimentado pelo segmento das bicicletas elétricas e mobilidade urbana. Mas essa análise não tem em conta fatores externos, como os indicadores de otimismo dos mercados específicos, as questões políticas, a maturidade de cada mercado, as guerras, etc.

Por exemplo, há alguns anos o BTT teve um pico de vendas em Portugal numa época em que os clientes fizeram a conversão das rodas de 26 polegadas para as de 29. Há poucos anos, aconteceu algo similar no ciclismo de estrada, ou seja, quem tinha bicicletas com travões de aro trocou por bicicletas com travões de disco. 

Atualmente as bicicletas elétricas e de gravel estão na moda, mas o consumidor luso não tem poder de compra suficiente para estar constantemente a trocar de bicicleta. Há também consumidores descontentes com os preços praticados no mercado. Em poucos anos passámos de bicicletas topo de gama que custavam 6.000 euros para 12.000 ou inclusivé mais. 

Há quem refira que embora o retalho tradicional esteja a sofrer, as lojas online estão a prosperar. Infelizmente também não é bem assim. Há marketplaces com saúde financeira, mas também há gigantes do retalho online que estão a atravessar uma fase complicada com uma diminuição nas vendas que pode ser explicada por vários fatores. Há até marcas como a Canyon (que até há pouco tempo apostava a 100% na venda online) a abrir lojas físicas, consciente de que há consumidores que gostam dos seus produtos, mas só os compram após verem e experimentarem. 

O mercado é complexo e atravessa várias dinâmicas, por isso, embora tudo indique que vai voltar a crescer, há muitas incertezas no ar. Por exemplo, há um plano europeu com financiamento para os Estados que visa apoiar a mobilidade suave - incluindo a construção de ciclovias e a expansão do sistema de aluguer de bicicletas partilhadas -, mas será que vai mesmo avante, ou a necessidade de mais fundos para a defesa da Europa vai obrigar a cortar nestes financiamentos? 

Além disso, durante algum tempo, as taxas de juro elevadas acabaram, de certa forma, com o chamado 'dinheiro barato', fazendo com que os intermediários pensassem duas vezes antes de comprar stock, o que sobrecarregou a cadeia de abastecimento. 

Mas há outro cenário que me preocupa mais. Os dados do Strava (uma plataforma de treino muito popular em todo o mundo) mostram que as novas gerações preferem correr do que andar de bicicleta. 

Atrevo-me a dizer que toda a indústria tem de agir já. Por um lado, as marcas têm de resolver de vez o problema no fornecimento de componentes, encontrando soluções que permitam fabricar bicicletas mais baratas, mas sem perda de qualidade. Por outro lado, temos de fazer tudo para cativar as novas gerações e mostrar que as bicicletas são uma maneira fantástica de se deslocarem ou fazer desporto. A indústria segmentou de tal forma o conceito de "bicicleta" que existe uma certa polarização que não faz qualquer sentido. 

A indústria das bicicletas sempre foi resiliente e há negócios a crescer, provando que nem tudo corre mal, mas o "big picture" é cinzento e requer astúcia e proatividade. Há inúmeras tecnologias a surgir, mas se não soubermos atrair as novas gerações - ou seja, os consumidores do futuro - corremos o risco de o consumo cair ainda mais a pique. 

O que achas disto? Deixa-nos o teu comentário. 

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